CECÍLIA MEIRELES
LITERATURA em DEBATE
O lirismo essencial
O
Fonte: www.premiom3.blogspot.com -
original de: Encicopledia Livre e Wikipedia
No centenário de nascimento da escritora Cecília Meireles, estudiosos de sua obra mostram que a poeta e cronista não era alienada da realidade
Autora de versos imortais, como "Eu canto porque o instante existe/ e a minha vida está completa./ Não sou alegre nem triste: sou poeta", a escritora Cecília Meireles é um dos principais nomes da literatura brasileira. Embora ainda sejam poucos os estudos mais aprofundados sobre a sua obra, seu centenário de nascimento, em 7 de novembro, vem provocando uma série de homenagens e debates por todo o Brasil. "Como ela não se filiou ao modernismo paulista de 1922 e é geralmente mencionada nas antologias apenas como uma poeta lírica, introspectiva e alienada da realidade política do seu tempo, a universidade a deixa um pouco de lado", afirma Ana Maria Domingues de Oliveira, da Faculdade de Ciências e Letras (FCL) da UNESP, câmpus de Assis.
Ana Maria tem toda a autoridade possível para falar do assunto, pois desenvolveu seu mestrado e doutorado sobre a poeta carioca. Autora da dissertação Estudo crítico da bibliografia sobre Cecília Meireles, apresentada na Unicamp, em 1988, e da tese De caravelas, mares e forcas: um estudo de Mensagem e Romanceiro da Inconfidência, defendida na USP, em 1995, ela tem uma relação visceral com a poeta. "Tudo começou ainda no ensino médio. Ouvi Chico Buarque cantando a música ‘Os Inconfidentes’ e fiquei apaixonada por aquela letra, que descobri ser de Cecília. Logo me deixei seduzir pelos seus versos", afirma a pesquisadora.
Essa paixão levou Ana a realizar, no mestrado, um levantamento de tudo o que havia sido escrito até 1988 sobre a poeta. "Cheguei a 640 títulos, desde notas em coluna social a teses de doutorado", contabiliza. "Minha dissertação, atualizada pela pesquisa de duas orientandas de Iniciação Científica, deve ser publicada ainda este ano pela Editora Humanitas e conta agora com cerca de mil referências à obra de Cecília."
No doutorado, Ana Maria aproximou Mensagem, de Fernando Pessoa, ao Romanceiro da Inconfidência, de Cecília. "As duas obras têm características épicas e partem de fatos históricos. Pessoa tem como modelo Os Lusíadas, de Camões, e Cecília, uma matriz mais popular, ligada às narrativas medievais. No poeta, há uma versão das viagens colonizadoras pelos mares sob o ponto de vista do colonizador, enquanto Cecília vê o episódio da revolta da Inconfidência Mineira pelos olhos do colonizado", analisa.
Para Rubens Eduardo Frias, professor de Literatura Hispano-americana do Instituto de Biociências, Letras e Ciências Exatas da UNESP, câmpus de São José do Rio Preto, a maior contribuição de Cecília Meireles para a literatura brasileira foi a elaboração de uma obra poética peculiar e de enorme sensibilidade. "É difícil perceber hoje as dificuldades da mulher que se dedicava à literatura. Cecília elevou a sua voz com uma poesia de alto nível, incluindo às vezes um fino e sutil erotismo feminino, como a argentina Alfonsina Storni e a chilena Gabriela Mistral", afirma.
x Órfã de pai e mãe desde os três anos de idade, Cecília foi criada pela avó materna, uma imigrante açoriana, e viveu, em 1935, o drama pessoal do suicídio do marido, o artista plástico luso Fernando Correia Dias, radicado no Brasil desde 1914, que havia sido capista da revista A Águia, em 1912, o periódico
A docente lembra ainda que Cecília não era a alienada que muitos comentam. "Ela dirigiu, de
Excelente tradutora, Cecília também passou para o português livros importantes, como Orlando, de Virginia Woolf, e Bodas de sangue, de Federico García Lorca, entre outros. "Ela lutou e derrubou preconceitos e tabus. Ao lado de Clarice Lispector, Cecília foi uma pioneira da literatura produzida por mulheres no País. Graças a elas, hoje uma mulher como Nélida Piñón ocupa a presidência da Academia Brasileira de Letras (ABL)", considera Frias, do Ibilce.
Lírica, intimista e mística, relacionada ao hinduísmo, Cecília Meireles enfoca temas como a precariedade da vida, do amor, e a fugacidade do tempo. A maior prova de que ela não era alienada está no Romanceiro da Inconfidência. Publicado em 1953, é o resultado de uma pesquisa exaustiva do século XVII mineiro. "Poucos parecem se lembrar que alguns dos versos desse livro foram utilizados como palavras de ordem para combater a ditadura militar nos anos 1970", diz Ana Maria.
Ao falecer, vítima de câncer, em 9 de novembro de 1964, Cecília deixou uma obra das mais importantes em verso da literatura nacional. "Ela compartilha com Manuel Bandeira a busca do verso melodioso e do ritmo musical. Em pleno modernismo, ela surge com um texto original e difícil de catalogar", afirma Frias. "Foi uma poeta única, que não deixou descendentes diretos. Sua forma de ver o mar, por exemplo, é única na literatura brasileira", acrescenta Ana Maria.
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